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O que falar ao paciente em quadros de doença grave?

Conversas Difíceis Doença Grave
Atendimento Médico

O que falar ao paciente em quadros de doença grave?

Devido o exercício de sua profissão, médicos são sempre colocados em situações complicadas, como o momento de comunicar notícias ruins para pacientes e familiares. Ter essas conversas difíceis são, sem dúvida, uma das maiores dificuldades para estes profissionais.

Médicos devem sempre estar preparados para conversas como estas na prática clínica, contudo, as universidades brasileiras não preparam os alunos para enfrentar situações que envolvam morte e sofrimento, motivo que requer preparação dos profissionais recém-formados logo após o término da graduação. A comunicação entre paciente e médico pode influenciar além da adesão ao tratamento, na satisfação com o atendimento realizado.

Para ajudar nas conversas difíceis, protocolos foram criados para lembrar aos profissionais pontos importantes a serem trabalhados em situações como esta. Entenda melhor como lidar com momentos difíceis para o paciente e seus familiares, conhecendo um pouco mais sobre este assunto, a seguir!

O termo más notícias

O termo más notícias qualifica qualquer informação que seja transmitida ao paciente e seus familiares, envolvendo de forma direta ou indireta uma alteração negativa na vida. Também deve ser definido do ponto de vista do paciente, sendo uma notícia recebida que seja considerada desagradável em seu contexto. 

Dessa maneira, ainda que seja comumente associada à transmissão de diagnósticos de doenças terminais, as más notícias podem tratar patologias menos dramáticas, entretanto, ainda traumatizantes para o paciente.

Um exemplo é um diagnóstico que determinará algumas mudanças na vida do paciente, como a cardiopatia em um atleta, uma resposta inadequada em determinada terapia, a necessidade de outro procedimento em um momento inoportuno, e mais. Dessa forma, o ato de ter conversas difíceis com os pacientes em algum momento da atuação profissional está presente na maior parte dos médicos.

A literatura oferece aos profissionais orientações gerais sobre como estruturar a transmissão de más notícias, tornando-a menos traumática para o médico e focando sua atenção no paciente. No entanto, a maior parte dos profissionais utiliza sua experiência na prática clínica ao realizar conversas difíceis, sendo o resultado nem sempre satisfatório.

Como ter conversas difíceis com o paciente

Até algumas décadas atrás, médicos optavam por omitir algumas informações de seus pacientes, considerando transmitir más notícias ao paciente algo danoso, sem que houvesse perspectiva de tratamento.

Com a evolução de métodos terapêuticos mudando o curso natural de doenças como o câncer, a comunicação do diagnóstico tornou-se mais fácil, visto que na maioria dos casos pode oferecer a esperança de cura.

Contudo, a necessidade de aprimorar a habilidade em discutir sobre o prognóstico com o paciente e seus familiares deve ser uma prioridade na formação e também após o término da graduação, uma vez que a medicina não é uma ciência exata, permitindo que o paciente evolua para melhora ou piora, apesar do diagnóstico e tratamento.

Poucos são os profissionais de saúde que conhecem protocolos como o SPIKES, que visa recolher informações dos pacientes, transmitir informações médicas, proporcionar suporte e induzir sua colaboração no desenvolvimento de uma estratégia terapêutica. Composto por 6 etapas, essa ferramenta desenvolvida por médicos norte-americanos auxilia na transmissão de más notícias durante conversas difíceis.

O paciente e seu direito diante da doença grave

Comunicar diagnóstico e prognóstico ao paciente fora de condições terapêuticas é uma tarefa difícil para toda a equipe. A falta de informação sobre o psiquismo humano não favorece a habilidade dos médicos ao lidar com o sofrimento humano.

Alguns escolhem comunicar notícias mais difíceis aos parentes mas não ao paciente, na intenção de evitar contato com eventual crise emocional. Outros, são sensíveis e melhor preparados para situações em que é preciso lidar com necessidades emocionais, obtendo êxito ao transmitir a existência de uma doença séria sem que a esperança lhe seja tirada.

O artigo 59 do Código de Ética Médica brasileiro proíbe que o profissional deixe de informar ao paciente seu diagnóstico, prognóstico, riscos e objetivos do tratamento, salvo quando a comunicação direta possa lhe provocar dano, devendo ser realizada ao responsável legal.

Ao decidir contar ao paciente sobre suas condições de saúde, é fundamental comunicar também que nem tudo é perdido, que ele não será abandonado por causa de seu diagnóstico e que ele terá o apoio do profissional não importando o resultado final. 

Desta forma, o paciente não temerá o abandono, isolamento, rejeição e poderá continuar confiante em relação a honestidade de seu médico. Essa aproximação é reconfortante até mesmo para seus familiares que poderão se encontrar impotentes diante de muitas situações. 

Entretanto, caso o paciente continue demonstrando por meio de comportamento, ou mesmo verbalmente, que não tem interesse em saber seu diagnóstico ou qualquer coisa relacionada à sua saúde, o médico não deverá forçá-lo a realidade. 

Reagindo à emoções

Da mesma forma como para o paciente, o ato de transmitir uma notícia desagradável causa desconforto ao médico por vários fatores. Inicialmente, este profissional se vê na situação difícil de lidar com emoções experimentadas pelo paciente e suas reações. Além disso, na maior parte dos casos, o profissional deverá se relacionar também com familiares deste paciente, fator que pode tornar-se uma fonte adicional de estresse. 

De outro ponto de vista, o médico também deverá lidar com suas próprias emoções e receios, enfrentando seus próprios medos e inseguranças. Isso é somado ao fato de que a maioria deles não recebeu treinamento adequado durante sua formação profissional que pudesse oferecer mais segurança no momento de ter conversas difíceis com o paciente. 

Muitos apresentam a opinião de que o paciente não é capaz de suportar uma notícia ruim relacionada à sua saúde, afetando dessa maneira, a evolução de seu quadro clínico de forma negativa, ou ainda que o médico seja responsabilizado diretamente pelo infortúnio que acabou de comunicar. 

Por esse motivo, o profissional tende a fornecer respostas que sejam vagas, minimizando em alguns casos a real gravidade do caso. A reação apresentada pelo paciente depende de fatores como personalidade, crenças religiosas, apoio da família e contexto cultural em que vive. 

Entretanto, nem sempre o médico tem a oportunidade de conhecer tais aspectos antes de ter conversas difíceis sobre o diagnóstico e prognóstico com o paciente. Deve-se considerar também que uma parte significativa dos pacientes não deseja conhecer seu diagnóstico, havendo maior dificuldade para que o profissional consiga identificar esse tipo de desejo, e respeitá-lo.

Reagir à emoções dos pacientes é uma das tarefas mais difíceis. Muitas vezes, o profissional não é capaz de responder de forma adequada aos sentimentos que foram expressados pelo indivíduo, ou mesmo identificá-los. Algumas emoções comuns, como desgosto, raiva e medo podem ser interpretadas como aversão ao próprio médico. 

Situações difíceis envolvendo familiares dos pacientes também não são incomuns. O profissional pode muitas vezes encontrar-se no dilema de revelar ou não uma informação adversa à saúde do paciente cujos familiares solicitam que nada seja revelado ao mesmo. 

Em momentos como este, o médico deve lembrar que seu compromisso é com o paciente, principalmente ao identificar o desejo de escutar todas as informações relacionadas à seu estado de saúde. Contudo, não é conveniente hostilizar os familiares. Por vezes o paciente demonstra falta de interesse em receber informações à seu respeito, apesar das oportunidades. Em outros casos, o paciente não é considerado capaz de receber tais notícias, sendo a família a melhor alternativa para a transmissão do quadro. 

Entre os erros mais comuns ao ter conversas difíceis com pacientes, encarar o processo da má notícia com sentimento de culpa ou fracasso é um deles. Para o profissional, fracassar de forma terapêutica pode significar um fracasso em sua profissão. É preciso buscar entender os próprios sentimentos no momento em que está comunicando notícias difíceis. Enfrentando medos e ansiedade e aprendendo a reconhecê-los e controlá-los, o médico consegue sentir-se mais à vontade frente às reações do paciente, ajudando-o da melhor forma possível.

Ainda que alguns indivíduos, seja de forma clara ou não, demonstrem não apresentar interesse para saber sobre as informações de sua doença e tratamento, a maior parte prefere ter conhecimento, pelo menos, de aspectos que sejam importantes. 

A falta de compreensão sobre seu quadro de saúde pode aumentar a ansiedade e dificultar o ajuste psicológico pelo qual o paciente deverá passar. Outros acabam sentindo-se extremamente angustiados, temendo estar sendo enganados pelos profissionais. 

Diante disso, é necessário ter bom senso e habilidade de comunicação ao transmitir as notícias, visto que a forma como a transmissão deve ser feito pode influenciar muito na compreensão e atitude do paciente diante de sua patologia. 

Ao serem transmitidas de forma brusca, as informações podem causar impacto extremamente traumatizante no paciente, que pode passar a ver seu médico como um inimigo, e não um aliado. Ao serem amenizadas de forma demasiada, as informações podem promover falsas esperanças e procedimentos desnecessários. 

O ideal é que o paciente possa ser capaz de compreender sua doença a ponto de aceitar participar no processo de decisão acerca das opções de tratamentos, reduzindo o estresse e ansiedade, mesmo em situações difíceis. Naturalmente, pessoas costumam temer o desconhecido, e um futuro incerto pode ser ainda mais angustiante que a verdade. Além disso, o paciente pode escolher por resolver questões que estejam pendentes, adotando medidas práticas para si, e também para sua família. 

A necessidade de protocolos

O paciente encontra uma nova realidade ao iniciar a busca por um diagnóstico ou tratamento, sendo muitas vezes suas vontades deixadas de lado. Toda a vivência hospitalar e em consultórios é acompanhada pelo medo da morte e do desconhecido, tornando-se marcante para o paciente. 

Inicia-se então uma relação em que o médico é o detentor do saber, responsável pela cura da enfermidade apresentada, e o paciente aquele com entendimento simbólico do que vive. A comunicação não deve abarcar apenas o que o paciente precisa saber, mas ser realizada de forma apropriada, garantindo sua compreensão, preocupando-se com sua reação afetiva e retenção de informação. 

Contudo, os receios apresentados por médicos podem interferir nessa relação, ou a forma como a notícia pode afetar a vida do paciente. Por motivos como este, um modelo de comunicação têm ganhado espaço, com novos protocolos estabelecidos.

Protocolo SPIKES

Um exemplo de novo modelo de comunicação com pacientes, o protocolo SPIKES é um mnemônico de 6 passos que auxilia em conversas difíceis com o paciente, proporcionando segurança ao médico. 

O protocolo SPIKES tem como finalidade facilitar a abordagem de assuntos delicados em conversas difíceis diante de pacientes com câncer, como diagnóstico, recidiva da doença e início do tratamento curativo ou paliativo. No entanto, seus princípios podem ser expandidos para outros cenários da prática médica. Ele apresenta 4 objetivos principais:

  • saber o que o paciente e seus familiares estão entendendo da situação de forma geral;
  • fornecer informações de acordo com o que o paciente e família suportam ouvir;
  • acolhê-los em qualquer reação que possa vir a ocorrer;
  • ter um plano de estratégia terapêutica. 

Etapa 1 – Planejando a entrevista (S – setting up the interview)

Na etapa inicial do protocolo, o ensaio mental é uma forma útil. O profissional deve planejar como realizar as conversas difíceis que possam conter más notícias para o paciente, e como responder à possíveis reações emocionais dele. O local da entrevista deve ser planejado, buscando privacidade para evitar interrupções, como ligações telefônicas. Neste momento, muitos pacientes preferem ter a conversa na presença de um familiar. 

Etapa 2 – Avaliando a percepção do paciente (P – Perception)

Por meio de perguntas, o profissional tenta perceber o quanto seu paciente compreendo do estado de saúde atual em que se encontra. A partir de suas respostas, o médico pode corrigir informações e moldar a notícia para seu entendimento, além de notar a possível existência de situações de negação da doença ou expectativa não realista do tratamento.

Etapa 3 – Obtendo convite do paciente (I – Invitation)

Enquanto muitos pacientes demonstram desejo de obter informações detalhadas sobre a doença, tratamento e evolução, alguns acabam preferindo esquivar-se das informações, como um mecanismo psicológico válido e mais comum em indivíduos com doença progressivamente grave. 

Caso o paciente em um primeiro momento escolher não saber mais detalhes, o profissional deve se colocar à sua disposição para esclarecer possíveis dúvidas futuras, ou conversar com um de seus familiares, caso seja sua vontade.

Etapa 4 – Ofertando conhecimento e informação ao paciente (K – knowledge)

Nesta etapa do protocolo SPIKES o uso do linguajar de fácil compreensão por parte de peitos é essencial, evitando expressões duras e frias durante a comunicação. Pacientes candidatos a realização de cuidados paliativos não podem ouvir frases desanimadoras, que possam transparecer a falta de investimento no quadro. 

Tais indivíduos têm outros objetivos terapêuticos que devem ser alcançados, como controle da dor e demais sintomas. As informações devem ser passadas aos poucos, certificando-se de forma periódica que o paciente esteja entendendo corretamente tudo o que for dito. 

Etapa 5 – Abordar emoções dos pacientes com respostas que sejam afetivas (E – emotions)

Durante as conversas difíceis relacionadas à sua saúde, os pacientes podem reagir das mais diferentes formas, como choro, raiva, tristeza e silêncio. Saber como lidar com estas reações, é uma das etapas mais difíceis no momento da transmissão de más notícias. O profissional deve oferecer ao paciente apoio e solidariedade por meio de um gesto ou frase afetiva.

Prosseguir para a discussão de outras questões antes que o pacientes se recomponha e a emoção passe não é indicado. Por isso, o médico deve dar ao indivíduo o tempo que for necessário para que ele possa se acalmar, e focar novamente nas informações que estão sendo fornecidas. Essa ação auxilia na redução do isolamento do paciente, expressando solidariedade e validando os sentimentos ou pensamentos do paciente como normais e esperados.

Etapa 6 – Estratégia e resumo (S – Strategy and Summary)

Antes mesmo de iniciar a discussão de planos terapêuticos, sejam eles curativos ou paliativos, recomenda-se ao médico perguntar ao paciente se ele está pronto para prosseguir a conversa, dando continuidade a discussão, e se aquele é o momento certo. Quando se tratam de medidas paliativas, é fundamental que o paciente apresente seu entendimento, evitando uma situação em que ele não compreenda o propósito do manejo, e possa superestimar sua eficácia. 

As informações médicas não devem ser limitadas, ainda que tenham um provável efeito negativo sobre o paciente, ao menos que isso seja um desejo dele. Todavia, revelar a verdade sem ter cuidado com a maneira como isso é feito ou o compromisso de oferecer suporte e assistência ao paciente, pode apresentar um impacto ainda pior do que a omissão de alguns fatos. A relação entre médico e paciente deve ser dinâmica, por isso, sua abordagem é flexível. O médico deve guiar-se pela compreensão, preferências e comportamento de seus pacientes.

O despreparo dos profissionais na comunicação de más notícias pode apresentar inúmeras consequências. Ainda que possa ter grande influência nas reações do paciente, as informações relacionadas à seu tratamento não deve ser omitidas, mas sim comunicadas da forma ideal. Por este motivo, é fundamental valorizar o momento de realizar conversas difíceis com o paciente, certificando-se de que este as compreendeu, assim como mostrar-se disponível para esclarecer dúvidas sobre o assunto. Além disso, atualizar-se sobre como transmitir as informações de forma adequada é essencial para médicos de todas as especialidades.

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Comment (1)

  1. […] período de permanência de um paciente na sala de emergência, seja ele um caso grave ou não, costuma ser estressante. A espera pelo atendimento, o entra-e-sai de pessoas, as […]

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